A Cultura em Ribeira de Pena
Não sei o que os partidos políticos apresentam como propostas para a cultura em Ribeira de Pena. Não sei, aliás, quase nada do que os partidos políticos apresentam como propostas para os quatro anos que se seguem. Até ontem, altura em que deixei a Ribeira por alguns dias, não tive acesso a qualquer programa eleitoral.
Não sei, portanto, como as candidaturas à Câmara Municipal encaram a cultura em Ribeira de Pena. Mas dei comigo a pensar – que me perdoem a imodéstia – que neste capítulo, mais do que qualquer candidatura, eu tenho ideias sedimentadas e ajustadas para o meu concelho. Há anos que trabalho nesta área, teorizando e praticando. Porque não passar então ao papel algumas ideias estruturantes do que eu acho que a autarquia deve fazer em termos de cultura?
Em primeiro lugar, em minha opinião, a Câmara Municipal não deve fazer cultura. Esclareçamos: a cultura é uma manifestação da comunidade humana, inerente à sua existência. A cultura pertence às pessoas e não propriamente às instituições. Os actos culturais promovidos pelas instituições, só são cultura quando assumidos e participados pelas pessoas. Assim, como principal responsável pelo bem-estar das populações, como primeiro nível de proximidade com as populações, o Município tem especiais responsabilidades na promoção, na criação de condições e no incentivo à prática cultural das populações que serve.
Ora se alguém me pedisse conselhos – o que não sucede, para tranquilidade dos leitores - eu definiria assim um programa político para uma legislatura num concelho como Ribeira de Pena.
1. Antes do mais, a cultura é um elemento que perpassa transversalmente toda a intervenção humana. Assim, mais do que um programa cultural, é absolutamente indispensável ter uma “visão cultural” dos problemas, abrangente, reflectida e profundamente radicada na especificidade do território, na sua história e nos seus costumes. Esta visão cultural permite afirmar especificidade e, simultaneamente, afirmar-se na modernidade.
2.Nenhuma entidade está melhor situada do que o Município para garantir a preservação da memória do concelho. Porque tem quadros, porque tem equipamentos e porque administra financiamentos significativos. De uma forma articulada com pessoas e outras instituições, deverá ter uma estratégia definida e um programa concreto para a preservação da memória.
Independentemente de em Ribeira de Pena existirem algumas obras de divulgação de qualidade, o estudo da história do concelho tem ainda muitas limitações. Há que promover a recolha sistemática de informação (escrita e documental) e incentivar a produção de trabalhos de investigação. Compete ao Município, neste capítulo, fazer o levantamento das áreas mais importantes a investigar, optar pelas mais urgentes, encontrar os financiamentos e as parcerias necessárias, estabelecer os contactos para a sua execução.
Na medida que a recolha de informação e o seu tratamento seja feito, haverá que ter em linha de conta a sua disponibilização junto das populações. E aí, e só aí, é que entram programações de edições, de criação de núcleos museográficos, de difusão de exposições, etc.
3. Compete ao município criar as condições indispensáveis para que pessoas e instituições do concelho dinamizem e promovam actos culturais. Ou seja, o Município é responsável pela disponibilização de equipamentos culturais. Em Ribeira de Pena há, neste capítulo, carências óbvias.
Mais do que a criação de infra-estruturas megalómanas, há que começar por inventariar no concelho todos os espaços que poderão, publicamente, ser disponibilizados para a prática cultural. Esse levantamento deverá incluir as necessidades de intervenção que potenciem a sua utilização, contratualizando-se com os seus proprietários as alterações e melhorias necessárias.
A construção da Biblioteca Pública Municipal e do Auditório agora em curso serão cruciais neste capítulo, devendo esta estrutura e os seus quadros serem o centro dinamizador de toda a intervenção cultural do Município. Mas espero que a sua intervenção não seja centralizadora e possa articular-se com uma actividade descentralizada por todas as freguesias.
Em termos de equipamentos de apoio, considero que o Município poderia e deveria possuir um Parque de Equipamentos de apoio cultural para disponibilização a título de empréstimo. Como exemplo, não é preciso comprar datashows para todas as associações, se houver a possibilidade de utilizar colectivamente um. E isto para todo o tipo de equipamentos de apoio às actividades cvulturais.
4. Compete ao município incentivar e dinamizar a prática cultural ao nível associativo. Isso significa que as populações, organizadas no âmbito de estruturas associativas, deverão encontrar no Município uma estrutura privilegiada para apoio logístico e financeiro. O Município deverá, por isso, promover anualmente reuniões com as associações, inteirar-se dos seus programas de trabalho e discutir em parceria os apoios possíveis e adequados. Elaborando posteriormente os necessários protocolos para a sua execução. Há aqui uma questão de atitude que gostaria de evidenciar – o Município não deve, apenas, estar receptivo às solicitações das instituições, compete-lhe a ele a tarefa de dinamizar e despoletar todo o processo. Não deve responder, apenas, deve ser pioneiro, andar à frente, incentivar. Evitando a política do subsídio e estabelecendo a atitude da parceria protocolada.
5. Como estrutura política, compete ao Município definir uma estratégia de intervenção a nível cultural. É essa estratégia que lhe possibilitará a definição das opções de intervenção, condicionadas à exequibilidade e ao financiamento. Estratégia que deve ter em linha de conta as carências e potencialidades inerentes ao concelho mas também as características e a afirmação da cultura moderna, nas esferas em que o concelho se insere neste mundo globalizado que vivemos. E que deve ser elaborada com ampla participação dos agentes culturais e da população. Desta estratégia deve decorrer, a muito curto prazo de tempo, um Programa Cultural plurianual, documento de opção política (preconizo programação ao nível de um mandato, com os ajustamentos necessários em cada ano).
6. Um Programa Cultural da responsabilidade do município deve depois ser posto em prática de uma forma participada. A minha opinião é a de que se deve privilegiar a execução do plano através dos agentes culturais locais e regionais, contratualizando as acções ou intervenções isoladamente ou em pacote. A filosofia do contrato-programa entre o Município e a instituição permite não só o financiamento como também o controle da qualidade previamente definido em caderno de encargos.
Nesta perspectiva, muito mais do que a simples atitude de entrega de subsídios, sem qualquer controle ou certeza de qualidade, deveria optar-se pela contratualização de iniciativas. Essa seria uma atitude prioritária, secundarizando os apoios pontuais a pedido das instituições e os subsídios avulsos.
7. De qualquer modo, as instituições culturais não possuem, normalmente, meios financeiros para garantir o seu funcionamento. O Município deveria pois, no âmbito do Programa cultural definido, contemplar o funcionamento das instituições para além do quadro das actividades, e nos moldes das disponibilidades financeiras.
Penso que, nestes oito pontos, ficam claras as ideias gerais que perfilho para uma política cultural no município de Ribeira de Pena. Não entro em pormenores e fujo, obviamente, às opções. Ficará então para um segundo artigo a possibilidade de referenciar carências e potencialidades, bem como apresentar um esboço de Programa plurianual. Um contributo para aqueles que, a partir de Outubro, assumirem os destinos do Município.